O mundo no século XXI*
Neste início de século nossa humanidade parece perplexa. O desenvolvimento tecnológico, aliado ao comércio em escala global, transformou em realidade o que há poucos decênios era ficção cientifica. Naturalmente nem todas as previsões, boas ou más, se cumpriram. Não navegamos pelas estrelas, nem passamos pelas catastróficas guerras nucleares previstas pelos mais temerosos.
Neste admirável mundo novo, que não é também o imaginado por Aldous Huxley[1], o ser humano encontra-se diante da capacidade de comunicar-se com grande parte do planeta instantaneamente, assiste ao caminhar dos robôs na superfície de Marte e, infelizmente, sofre com a grande facilidade com que os malfeitores conseguem aproveitar-se de todo esse avanço em detrimento da sociedade.
O homem que troca e-mails pela Internet e viaja de supersônico entre os continentes continua tão sujeito ao sofrimento quanto seu antepassado distante, que na busca do alimento cotidiano, mal se distanciava da proteção que os abrigos naturais lhe proporcionavam.
Naturalmente não se deve exagerar este fato. Da mesma forma que nos primórdios da civilização, estamos sujeitos as leis de causa e efeito e a do progresso. O homem é impulsionado para a frente pela necessidade de buscar melhores condições de vida e ao mesmo tempo recebe o retorno de seus atos. Quanto mais ajustados a lei maior, “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo“, mais distantes das dores extenuantes e com maiores possibilidades de desfrutar a felicidade relativa do plano terrestre.
A Causa
A causa de termos dominado a matéria e, conseqüentemente, melhorado continuamente o padrão de vida no globo terrestre, foi o empenho no desenvolvimento da inteligência, no aperfeiçoamento das estruturas sociais, na melhoria da organização econômica. Por outro lado, a permanência do sofrimento e a persistência do mal resultam do pouco empenho que sempre demos ao nosso desenvolvimento espiritual através das eras.
Não é por falta de avisos do plano espiritual, avisos que foram registrados em todas as religiões do planeta, em todas as línguas conhecidas, em todas as épocas da humanidade. E mesmo assim continuamos, como humanidade, fazendo-nos de surdos e a ignorar todo o esforço em prol do domínio próprio e da educação para a vida eterna.
E assim continuaremos, séculos adiante, se não mudarmos nosso enfoque. De pouco nos adiantará termos redes mundiais se elas estiverem cada vez mais infestadas por fake news, vírus e ataques, sinais evidentes de que o homem espiritual não se encontra no mesmo nível que o homem tecnológico. De pouco nos adiantará termos meios de transporte cada vez mais rápidos se não pudermos sair de casa por medo da violência. De muito pouco nos adiantará termos todas as facilidades para o trabalho e o lazer se não tivermos um minuto de sossego frente a insegurança do que o próximo minuto nos trará.
Para aproveitarmos integralmente este admirável mundo novo que os novos tempos nos trouxeram há que fazer nascer dentro de nós o homem novo, é desenvolvermos dentro de nós aquele reino dos Céus do qual nos falou Jesus. Reino dos Céus que ele comparou com a pequena semente de mostarda, semente que plantada e cuidada dá nascimento a uma árvore imensa.
Desenvolvermos o Reino dos Céus em nós mesmos é um programa vasto e ambicioso, é o caminho estreito tão difícil de trilhar, mas que ao fim leva a melhores destinos que o caminho largo das facilidades terrestres, caminho largo que inevitavelmente termina em desilusões após o túmulo. O caminho correto é estreito, mas é o caminho que traz a paz de espírito em conseqüência da consciência tranquila. É difícil de trilhar, mas traz a colheita das bençãos resultantes do agir de acordo com as leis divinas.
O Caminho
Este caminho, que da mesma maneira que os caminhos terrestres tem mapas detalhando-lhe os percalços, encontra-se mapeado nas grandes obras religiosas da humanidade. No Vedanta e nas Upanishads encontramos seus traçados mais antigos, o vemos novamente ensinado nos Sutras Budistas, na sabedoria do Tao e na disciplina de Confúcio, o encontramos na austeridade da lei Mosaica e na filosofia de Sócrates e Platão. Vemos sua exemplificação na Boa Nova de Jesus de Nazaré.
Dentro das correntes que se desenvolveram a partir da mensagem de Jesus, o vemos seguido nas vidas dos grandes nomes da Igreja Católica, basta relembrarmos Francisco de Assis e Teresa de Ávila. O vemos defendido pelos grandes nomes da Reforma Protestante, como o reformador tcheco João Huss. E o encontramos no ardor humanitário dos grandes nomes da ciência, como Pasteur, Chagas ou Sabin.
Nesta mesma corrente de pensamento religioso, entendendo por pensamento religioso a busca incessante da realidade maior, temos também a Doutrina Espírita. Doutrina que descerra as cortinas do mundo espiritual, dando ao ser humano bases novas para a compreensão do Universo e evidencia sua ordenação moral.
O Espiritismo apresenta ao espírito humano as leis que o levam do ponto inicial de sua jornada, onde começa simples e ignorante, até o estágio de espírito iluminado, totalmente desprendido da matéria, auxiliar de Deus na infinita tarefa da criação.
Nós, ligados aos ensinamentos da Doutrina dos Espíritos, encontramos o caminho traçado nas páginas das inumeráveis obras espíritas, todas elas tendo por base segura o trabalho de codificação (análise e organização) realizado por Allan Kardec.
Para que este admirável mundo novo, em que começamos a viver, seja realmente um mundo novo, voltemos as fontes antigas de sabedoria e delas tiremos as lições, que aplicadas, o tornará não somente novo, mas também melhor para se viver.
Muita Paz,
Carlos A. I. Bernardo
Observações
[*]Artigo publicado no Boletim GEAE, número 469 de 27 de janeiro de 2004. Atualizado e adaptado para a publicação neste blog.
[1] – Autor do romance “Admirável Mundo Novo” (1931) que apresenta uma visão pessimista do futuro da humanidade, dominada pela uniformidade e pela tecnologia.